13.12.08

Assassinato sem Motivo Aparente

Artigo publicado em julho de 1960 no The American Journal of Psychiatry e escrito em colaboração de Karl Menniger, Irwin Rosen e Martin Mayman -, declara o seu objetivo no início:

"Tentando determinar a responsabilidade criminal dos assassinos, a lei tenta dividi-los, bem como a todos os trangressores, em dois grupos: os 'sãos' e os 'insanos'. O chamado assassino 'são' é tido como aquele que age segundo motivos racionais que possam ser compreendidos, embora condenados; e o 'insano', como o levado por motivos irracionais e absurdos. Quando os motivos racionais são conspícuos (por exemplo, quando um homem mata por lucro pessoal), ou quando os motivos irracionais se fazem acompanhar por decepções ou alucinações (por exemplo, um paciente paranóico que mata aquele que a sua fantasia transformou em perseguidor), a situação apresenta poucos problemas para o psiquiatra. Mas os assassinos que parecem racionais, coerentes e controlados, e, no entanto, cujos atos homicidas possuem um qualidade bizarra e aparentemente sem sentido, constituem um problema difícil, se as divergências da Corte e os relátorios contraditórios acerca do mesmo trangressor são sintomáticos. Nossa tese é de que a psicopatologia desses assassinos forma ao menos uma síndrome específica que descreveremos. Esses indivíduos, em geral, possuem uma predisposição para sérios lapsos no controloe do seu ego - o que torna possível a expressão aberta de violência primitiva, gerada em experiências prévias e, agora, inconscientes e traumáticas."

Os autores, no decorrer de um recurso jurídico, examinaram quatro homens condenados por crimes aparentemente sem motivo. Antes do julgamento, todos foram examinados e tidos como "sem psicoses" e "sãos". Três deles à penas de morte e o quarto a uma longa sentença. Em cada um dos casos, uma investigação psiquiátrica mais extensa foi pedida porque alguém - não se satisfizera com as explicações psiquiátricas dadas previamente e perguntara: "Como pode um homem são como este fazer um loucura dessas? E ser condenado por isso?" Após descrever os quatros criminosos e seus crimes (um soldado negro que mutilara e desmembrara uma prostituta, um trabalhador que estrangulara um menino de quatorze anos quando viu suas investidas sexuais repelidas, um cabo do Exército que espancara outro menino até matá-lo porque imaginou que a vítima estivesse debochando dele e um empregado de hospital que afogara uma menina de nove anos segurando sua cabeça debaixo da água), os autores examinaram as áreas de similaridade. Os próprios homens não sabiam (escreveram) porque tinham matado aquelas pessoas, quase que estranhas, e em cada instância o assassino parece ter caído nun transe irreal dissociativo do qual acordara para "de repente descobrir-se atacando sua vítima". O achado histórico mais significativo, mais uniforme, era de uma prolongade e às vezes vitalícia história de controle errático sobre os impulsos agressivos. Por exemplo: três dos homens tinham sido freqüentemente envolvidos em lutas que não eram apenas altercações comuns e que se teriam transformado em ataques homicidas, não fossem impedidos por outros.

Aqui vão resumidas algumas outras observações contidas no estudo:

"Apesar da violência em suas vidas, todos tinham seu próprio ego a seguinte imagem: eram fisicamente inferiores, fracos e inadequados. Cada um deles revelava um alto grau de inibição sexual. A todos eles as mulheres adultas pareciam criaturas ameaçadores e, em dois casos, havia pervesão sexual declarada. Todos, também, haviam temido em seus primeiros anos serem considerados 'maricas', fisicamente subdesenvolvidos ou doentios... Nos quatro casos, havia prova histórica de estados alterados de consciência, freqüentemente ligados a explosões de violência. Dois deles relataram dois graves estados dissociativos de inconsciência durante os quais se observara comportamento bizarro ou violento, enquanto os outros dois relataram episódios menos graves, talvez menos organizados, de amnésia. Durante os momentos de violência real, sentiam-se, em geral, separados ou isolados de si mesmos, com se estivessem observando outra pessoa... Notada também no histórico dos quatro casos de violência paterna durante a infância... Um deles declarou que "era chicoteado cada vez que dava as costas". Outro disse que apanhava violentamente para corrigir sua gagueira e 'ataques', como também para castiga seu mau comportamento... A história relativa e extrema violência, fantasia ou não, observada na realidade, ou realmente vivida pela criança, casa-se com a hipótese psicanalítica de que a exposição da criança a estímulos esmagadores, antes que possa controlar, está intimamente ligada a defeitos precoces na formação do ego e, mais tarde, a graves pertubaçoes no controle dos impulsos. Em todos os casos, havia prova de extrema privação emocional nos primeiros anos de vida. Esta privação pode envolver a ausência prolongada ou recorrente do pai ou da mãe, ou de ambos, um vida familiar caótica na qual os pais não eram conhecidos, ou uma rejeição frontal da criança pelo pai ou pela mão, sendo a criança criada por outras pessoas... Prova de pertubações na organização afetiva foi notada. Mas, tipicamente, os homens demonstravam um tendência a não experimentar o ódio ou ira associados às ações agressivas de violência. Nenhum deles narrou sentimentos de raiva em conexão com os assassinatos, nem experimentou ódio pronunciado, embora cada um deles fossem capazes de agressão enorme e brutal... Suas relações com os outros eram de natureza pobre e fria, devido à solidão e isolamento. Sentiam com pouca intensidade. As outras pessoas eram poucos reais para eles no sentido de um sentimento afetuoso ou mesmo de raiva... os três homens aguardando a pena de morte demonstravam pouca emoção em relação a sua sorte e a de suas vítimas. Culpa, depressão, remorso, marcadamente ausentes... Tais indivíduos podem ser considerados como propensos ao assassinato no sentido de que carregam uma sobrecarga de energia agressiva ou que possuem um sistema instável de defesa do ego que permite periodicamente a expressão nua e arcaica de tal energia. O potencial assassino pode ser ativado, especialmente se algum desequilíbrio já se encontra presente, quando a futura vítima é inconscientemente percebida como figura-chave de alguma configuração traumática de seu passado. O comportamento, ou mesmo simples presença desta figura, acrescenta uma tensão ao equilíbrio de forças que resulta numa súbita e extrema descarga de violência, semelhante à explosão de um espoleta numa carga de dinamite... a hipótese de motivação inconsciente porque os assassinos perceberam nas vítimas inócuas e relativamentes desconhecidas provocações que se tornaram, portanto, alvos adequados de agressão. Mas por que assassiná-las? A maior parte das pessoas, felizmente, não revida com explosões assassinas, mesmo sob a mais extrema provocação. Os casos descritos, por outro lado, estavam predispostos a grandes lapsos de contato com a realidade e extrema fraqueza no controle de seus impulsos durante períodos de grande tensão e desorganização. Nestes períodos, um conhecido de vista ou mesmo um estranho facilmente perde seu significado 'real' e assume uma identidade na configuração traumática inconsciente. O 'velho' conflito se reativou e a agressão cresceu rapidamente até atingir proporções assassinas... Quando estes assassinatos sem sentido ocorrem, parecem o resultado final de um período de tensão crescente e desorganização no assassino, começando antes do contato com a vitima que, por ajustar-se aos conflitos inconscientes do assassino, serve, sem o desejar nem saber, para pôr em ação seu potencial homicida".


Leia o livro 'A Sangue Frio' de Truman Capote.

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